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25 Abril: Civis da Figueira da Foz ajudaram operações militares para derrubar ditadura

Um grupo de civis da Figueira da Foz colaborou há 50 anos com as operações militares do 25 de Abril, embora sem conhecer os planos concretos do MFA para derrubar a ditadura de Salazar e Caetano.

Joaquim de Sousa, um dos cidadãos que apoiaram os responsáveis locais do Movimento das Forças Armadas (MFA), na noite de 24 para 25 de Abril, recordou que tinham “apenas uma perceção de que ia acontecer qualquer coisa, não mais do que isso”.

“Fomos os inocentes úteis, mas participámos para todos os efeitos”, disse à agência Lusa o antigo professor do Liceu Nacional da Figueira da Foz.

Na véspera do golpe, o capitão Dinis de Almeida dirigiu-se ao antigo café Nicola, junto ao Casino Peninsular, e incumbiu dois membros da Oposição Democrática, Joaquim de Sousa e José Baldaia, de irem vigiar as estradas entre a cidade balnear, Aveiro e Viseu.

Baldaia seguiu na sua viatura para Viseu, na companhia de José Manuel Paulo, já falecido, conhecido por Paulo ‘Faca’.

Joaquim, mais tarde presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, escolheu Mário Ribeiro como coadjutor da missão.

“O amigo Mário julgava que ia distribuir panfletos”, contou, entre sorrisos, o antigo autarca do PS, partido do qual viria a afastar-se.

Os civis não viram ninguém no caminho, porque as colunas do MFA avançaram pelas matas. Em caso de encontro, contudo, tinham a senha e a contrassenha: “Coragem… pela vitória”.

“A noite dos inocentes úteis” foi, a propósito, o título de um artigo publicado em abril de 1998 no semanário “A Linha do Oeste”, já desaparecido, da autoria do diretor, António Tavares.

O jornal fez um retrato dos acontecimentos, aludindo à participação de Joaquim de Sousa, Mário Ribeiro, Paulo ‘Faca’ e José Baldaia, que a Lusa não conseguiu ouvir, por se encontrar doente.

No grupo, mais uma pessoa estava a par do que iria suceder de madrugada, quanto ao envolvimento de civis: Amélia Campos, na altura casada com Baldaia, ficou em casa, na rua D. José I, junto ao Liceu (atual Escola Secundária Joaquim de Carvalho), enquanto o marido e os camaradas seguiram para os acessos a Aveiro e Viseu.

A residir há vários anos nos Açores, Amélia Campos tinha 26 anos e era professora de português e francês, na mesma escola onde Joaquim de Sousa dava aulas de matemática.

“Nesse dia, vim de fazer exame de ciências pedagógicas, aquelas cadeiras que se faziam depois do curso, para quem queria ser professor, e quando cheguei a casa estavam na minha sala o Zé Baldaia, o Quim Sousa e o Paulo ‘Faca’. O Zé tinha ido ao quartel, porque acabara o serviço militar e tinha uns dinheiros atrasados a receber, e encontrou um capitão que lhe perguntou o nome e lhe pediu apoio”, relatou Amélia Campos.

“Isto parece uma história de ficção, mas é verdade”, observou a irmã do ex-ministro da Saúde Correia de Campos, coincidindo com Joaquim na reconstituição do que se passou nessa noite.

O capitão em causa era Dinis de Almeida, que destacou para casa dos Baldaia o oficial de dia do Regimento de Artilharia Pesada (RAP 3), para fazer a ligação entre civis e militares. Amélia lembrou que os insurretos civis comeram pouco ao jantar.

Apenas “qualquer coisa à pressa”, numa festa de anos por onde passaram, na qual estavam mais elementos do secretariado da Oposição Democrática, deixados na ignorância sobre o que iria acontecer, para estarem a postos quando soasse a primeira senha radiofónica do MFA, a música “E depois do adeus”, cantada por Paulo de Carvalho, às 22:55, a que se seguiu, às 00:20 de 25 de Abril, “Grândola, Vila Morena”, de José Afonso, dando sinal para a saída dos quartéis.

À espera de informações de quem tinha ido para o terreno e haveria de chegar de madrugada, Amélia Campos estava em casa com o militar, até então desconhecido: “Nem lhe dei nada para comer ou beber, ficámos ali a seco”, gracejou.

Pela manhã, a vida seguiria numa aparente normalidade e os docentes Amélia e Joaquim foram para o Liceu, sem revelarem o que tinha sucedido.

Até porque a PIDE estava à espreita. Sabiam também que um contínuo e um colega professor eram informadores da polícia política.

Na Figueira da Foz, a celebração na rua da vitória sobre o fascismo seria a 27 de abril: “Foi uma festa enorme, extraordinária”, enfatizou Amélia Campos.

Casimiro Simões e José Luís Sousa – agência Lusa

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